Saímos para mais um daqueles pedais longos para treinar e passear ao mesmo tempo. O roteiro escolhido foi contornar a maior lagoa de Santa Catarina, a Lagoa de Imaruí, no sul do estado, num total de 110 km de pouca altimetria.

Com uma análise rápida na previsão do tempo que mostrava vento nordeste predominante ao longo do dia, acabamos por decidir realizar o percurso no sentido horário, partindo do bairro Nova Brasília, em Imbituba. Assim poderíamos desfrutar um pouco da velocidade de um pedal na beira da BR com vento a favor.

E rapidamente avançamos e chegamos na região de Cabeçudas, em Laguna, para cruzar a lagoa através da Ponte Anita Garibaldi.

Na saída da ponte tivemos um dos pneus cortados por um caco de vidro, o que nos rendeu um belo atraso.
O corte era muito grande e o pneu, de tecnologia tubeless, não conseguiu reter o líquido para estancar o vazamento e tivemos que improvisar um remendo para poder andar até achar uma borracharia.
Foi uma verdadeira “obra-prima”, utilizando-se de borracha de pneu velho e elástico de cabelo, mas que nos possibilitou achar uma solução mais definitiva com um borracheiro.

Depois que arrumamos o pneu cortado, saímos da BR-101 para o acesso ao município de Pescaria Brava. O trecho começou em asfalto, passando para um bom calçamento e finalmente se transformou em estrada de chão.
Seguíamos avistando a lagoa ao longe, passando por uma área rural com belas propriedades por todo o percurso. Sem longas subidas, a estrada seguia num sobe e desce suave, às vezes ladeada por campos, outras, por moradias.

A medida que avançávamos no terreno, o vento nordeste foi sumindo e a temperatura do dia foi aumentando, até o dia se transformar num calor escaldante. E o mal estar com a temperatura foi agravando pela ausência de postos de reabastecimento, pois embora na estrada houvesse várias “vendas” ou mercadinhos, TODOS estavam fechados.
No meio da tarde conseguimos reabastecer com água graças a simpatia dos moradores locais, que nos comentaram sobre a existência de uma cachoeira não muito distante, onde haveria uma lanchonete. E lá fomos.
Embora o local fosse desprovido de beleza natural (era um açude!), podemos nos alimentar e repor nossas energias. Ficamos ali por um tempo e decidimos partir quando vimos que o tempo estava mudando e que uma tempestade estava se armando.
Ficamos bastante impressionados quando nos aproximamos novamente da Lagoa: vinha do sul uma nuvem muito densa, numa tempestade assustadora que avançava em nossa direção.

Mesmo assim, como ainda faltavam quase 50 km para terminar o percurso, continuamos pedalando na esperança que chegaríamos ao destino antes da tormenta.
Mas logo a frente um morador local gritou “Busquem um abrigo que isso é pedra!”.
E a tempestade avançou rapidamente, fazendo que buscássemos abrigo no primeiro local seguro que avistamos: uma parada de ônibus.

O nosso “Bunker” acabou se mostrando um local bastante seguro. Todo de alvenaria, inclusive o teto, fechado na parte voltada para o sul e com muradas laterais que nos protegiam parcialmente.
Dali vimos aquela nuvem negra “engolir” toda a paisagem, fazendo sumir os morros e a lagoa a nossa frente.

Primeiro veio o vento firme, quente, seco e com muita areia, mesmo vindo sobre a lagoa. E o dia escureceu às 16:30 horas.

Depois o vento ficou mais forte, com rajadas violentas, que trazia junto uma chuva de pingos grossos.
Vimos as árvores próximas sacolejarem violentamente e as telhas de uma casa próxima começarem a levantar. A qualquer instante parecia que o telhado ia ser levado inteiro.
Veio um barulho forte de algo que tinha caído sobre o telhado do nosso abrigo e vimos que era uma tampa enorme de uma caixa d’água que tinha voado e parado ali. Umas telhas caíram na parte da frente, mas nada nos atingiu ali dentro. Felizmente o nosso abrigo era firme.
Depois disso, passou uma mesa branca de plástico rolando pela estrada.
Em meio a tanta tensão falávamos besteiras para relaxar e até uma vaca voando achávamos que viria, lembrando do filme Twister.

Num dado momento o tempo deu uma clareada e o vento mudou de direção, pegando de lado em nosso abrigo. A chuva nos atingia, deixando todos molhados, mas ainda era relativamente seguro. Nos abaixamos para tentar nos proteger do frio e de algum objeto que pudesse vir voando.
E o vento continuou forte por muito tempo, parecia que não acabava nunca.
Não sabemos dizer exatamente por quanto tempo ficamos ali, a impressão que tínhamos que era uma eternidade. Mas na verdade a tempestade durou cerca de uma hora.
Quando o vento se acalmou resolvemos continuar nosso percurso, mesmo com a chuva que ainda caía. E vimos uma paisagem desoladora.

Muitas casas parcialmente destelhadas, muitas árvores caídas, muitos galhos de árvore caídos na estrada e nos campos. Nos locais mais habitados os moradores saíam para a rua para ver os estragos que a tempestade havia feito.
E a medida que avançávamos mais e mais casas danificadas, árvores caídas e estragos. De repente veio um aroma bom no ar, e vimos que era o resultado dos eucaliptos que haviam se quebrado ou caído.

Mais a frente, perto da lagoa, muitos pássaros voavam em círculos, como que perdidos ao verem as árvores no chão.
Quando chegamos na cidade de Imaruí começou uma trovoada forte e novamente pegamos um abrigo. Mas dessa vez a chuva já foi bem mais tranquila, diríamos que “normal”, principalmente se comparada com a primeira fase da tempestade…
No centro da cidade vimos mais estragos, mas não tínhamos o que fazer.
Toda a região estava sem energia elétrica, e passamos por vários carros da empresa de energia trabalhando (ou seria o mesmo de um lugar para outro?). Vimos que os celulares também estavam sem serviço e não tinha como avisar em casa que estávamos bem.
Estávamos ainda a quase 30 km de nosso destino e resolvemos seguir num ritmo firme pelo asfalto. Revezávamos entre pedalar na pista e no precário acostamento e assim finalmente chegamos ao nosso destino, onde nosso veículo se encontrava inteiro, num estacionamento cheio da sujeira que tinha voado.
Voltamos para casa realmente impressionados com a força da tempestade e seus efeitos, quase esquecendo do calor que tínhamos passado mais cedo naquele dia.
Depois, mais tarde, ficamos sabendo que a tormenta tinha provocado amplos estragos em municípios da região.
Felizmente, nada nos aconteceu.
Mas foram fortes emoções.